Imigração
Québec aprova novo modelo de integração: o fim do multiculturalismo à canadense?
O Québec aprovou a Lei 84, criando um novo modelo de integração para imigrantes e rompendo com o multiculturalismo canadense.

O Québec aprovou a Lei 84, criando um novo modelo de integração para imigrantes e rompendo com o multiculturalismo canadense. Entenda como as novas regras afetam quem deseja morar na província e quais são as exigências de integração à cultura e ao contrato social québécois.
Québec, 28 de maio de 2025. Nesta quarta-feira, a Assembleia Nacional do Québec aprovou, por ampla maioria (86 votos a favor e 27 contra), a aguardada Lei 84, oficialmente chamada de “Loi sur l’intégration à la nation québécoise” (Lei sobre a Integração à Nação Québécois). Com isso, o Québec estabelece formalmente seu próprio “modelo de integração nacional”, colocando de vez o multiculturalismo canadense — pelo menos, em teoria — “nos limbos da história”, segundo o Ministro da Imigração, Jean-François Roberge.
O novo modelo, descrito pelo ministro como “fundamental”, determina que o Estado e todos os residentes da província têm o dever de participar ativamente da integração dos novos imigrantes. Em contrapartida, espera-se desses novos habitantes que aceitem e participem do chamado “contrato social” — um conjunto de valores e práticas inscritos na própria lei.
“Pela primeira vez, estamos estabelecendo nosso próprio modelo, chamado de integração nacional. […] A partir de agora, quem vier ao Québec terá que conhecer esse contrato social, saber que está vindo para um Estado com seu próprio modelo de integração, com deveres e responsabilidades, sabendo que é bem-vindo, mas que precisa aceitar esse contrato social. Caso contrário, talvez não seja uma boa ideia vir para cá.” – Jean-François Roberge, Ministro da Imigração
O que muda na prática?
Segundo o Ministro Roberge, a principal mudança é o “narrativo” e a clareza sobre o que se espera de quem escolhe o Québec como novo lar. Diferentemente do modelo multiculturalista canadense — que incentiva a manutenção irrestrita das culturas de origem —, o modelo québécois exige adesão à “cultura comum”, tendo a língua francesa como veículo principal e valores como a igualdade de gênero e a laicidade do Estado como pilares.
“Aqui não é os Estados Unidos, nem a França, nem Ontário. No Québec, temos nosso próprio modelo. Quem chega precisa entender nossas tradições, nossa história, nossos valores, e aprender o francês. Esse é o contrato”, reforçou Roberge conforme relatado pelo jornal Le Devoir.
Além disso, o texto prevê que financiamentos públicos para projetos e organizações — como festivais e eventos culturais — estejam condicionados ao respeito a esses princípios de integração nacional. Uma Política Nacional sobre Integração deverá ser apresentada nos próximos 18 meses, detalhando como ministérios e instituições aplicarão as novas regras.
Comunidade, laicidade e “comunitarismo”
O ministro fez questão de enviar um recado claro aos chamados “comunitaristas” — pessoas ou grupos que desejam manter modos de vida completamente separados da sociedade de acolhida: “Essas pessoas deveriam pensar duas vezes antes de escolher o Québec. Não faz sentido vir se não concordam com o contrato social ou com o funcionamento da nossa sociedade”.
“Até semana passada, alguém que pensava em vir ao Canadá e talvez ao Québec podia imaginar que chegaria aqui e, dentro do multiculturalismo canadense, o Estado garantiria que pudesse manter sua cultura e sua língua de origem. […] Agora, quem pensa em se instalar no Québec vai ler um contrato social diferente e vai se perguntar: ‘Será que quero mesmo vir para o Québec? Tenho disposição de aprender francês, de conhecer uma cultura distinta?'” – Jean-François Roberge, Ministro da Imigração
A lei reafirma ainda a importância da laicidade do Estado e do predomínio da língua francesa, inclusive em instituições privadas subvencionadas, creches (garderies), escolas e universidades. Segundo o ministro, todos os órgãos do governo, inclusive empresas que recebem subsídios, deverão se alinhar ao novo modelo.
Como será avaliada a integração?
O governo ainda vai definir, na política nacional, os critérios de avaliação da integração. Mas, de acordo com o ministro, já é possível apontar alguns indicadores: domínio da língua francesa, conhecimento dos valores e da história do Québec e participação na vida social. O ministro reforçou que a integração “vai além do quantitativo” e deve ser acompanhada tanto por dados objetivos quanto por análises qualitativas.
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Referências e créditos
- Le Québec se dote d’un nouveau «modèle d’intégration» des immigrants, Le Devoir, 28/05/2025.
Leia o artigo completo (em francês) - Point de presse de M. Jean-François Roberge, Ministro da Imigração, de la Francisation et de l’Intégration (transcrição integral disponível aqui – 28/05/2025).